Baunilha quebrada, 10 dias de atraso na viagem e novos amigos hermanos
Foram 10 dias parados, um prejuízo de 11.500,00 pesos, meia dúzia de novos amigos e muita história pra contar. Estávamos super felizes por estar finalmente chegando próximo à Ushuaia, era uma sexta-feira fria mas ensolarada. Quando saímos de Caleta Olivia avistamos uma mancha marrom na beira da praia e paramos para ver o que era, para minha alegria (que vim falando disso o caminho todo) eram muitos lobos marinhos. Eles eram em mais ou menos cinquenta, de todos os tamanhos possíveis e estavam ali bem diante dos meus olhos, dava até para tocar neles se eu quisesse, pudemos ficar ali bem do ladinho deles observando em pleno habitat natural sem pagar nada.
Nosso dia havia começado perfeito e a estrada estava como sempre, vazia de carros e cheia de Guanacos para admirar. Saíamos de Caleta Olivia com direção a Puerto San Julian, que são aproximadamente 350 km de distância, a ideia central era dormir em Puerto San Julian e seguir viagem no dia seguinte mas infelizmente isso não foi possível. Faltava aproximadamente 50 km para chegarmos ao nosso destino quando ouvimos um barulho muito alto no motor, paramos imediatamente e o Jefferson foi ver se não tinha nada solto ou algo do tipo, aquela altura ele já imaginava o que tinha ocorrido, mas não quis acreditar no pior e seguimos com cautela até a cidade.
Acordamos no dia seguinte e fomos até o mecânico indicado pelo frentista do posto em que paramos, chegamos no mecânico e explicamos o que havia acontecido, ele deu uma olhada no motor , escutou o barulho e nos deu a pior notícia de todas, o motor tinha fundido. Ele nos deu a relação de peças que deveríamos comprar e deixou claro que na cidade não existia lugar algum para conseguirmos essas peças.
Passado o nervoso e a revolta fomos novamente até o posto de gasolina usar a internet e tentar o mais rápido possível achar uma solução para o enorme problema. Estávamos muito longe de casa, em uma região super afastada, cidade pequena, dinheiro curto e tudo de pior que podíamos imaginar. O nosso desespero era tanto que até pensamos em mandar a Baunilha para o Brasil de caminhão cegonha e desistirmos da viagem indo embora de ônibus. Depois de pensarmos um pouco mais e avaliar os custos resolvemos que íamos pedir as peças do Brasil e esperar parados no posto de gasolina os aproximadamente 15 dias de prazo. O pai do Jefferson correu atrás de tudo no Brasil para tentar nos mandar as peças, mas precisava da medidas do motor e isso só era possível abrindo o motor.
Voltamos na oficina em plena sexta-feira e explicamos tudo de novo pro mecânico, que pediu para que voltássemos sábado pela manhã para desmontar o motor e ver o que realmente iria ser necessário. Passamos o dia todo na oficina, comemos um lanche feito na oficina mesmo e finalmente descobrimos o que tinha acontecido.
O motor não tinha fundido, estava em bom estado mas havia uma peça partida ao meio, o virabrequim (chamado de cinguenal na Argentina). Essa peça é de ferro fundido e praticamente impossível de quebrar, ainda mais em uma kombi a 80 km/h. Ninguém conseguiu entender o que havia acontecido, mas dos males foi o menor, pois era mais fácil e mais barato de arrumar.
Acabamos fazendo amizade com o mecânico “El Pelado” ou como dizemos no Brasil “O Careca”, dormimos dentro da oficina todos os dias e ele deixava um carro a nossa disposição para podermos ir ao banheiro (na oficina não tinha banheiro) e usar a internet do posto de gasolina que era bem perto. O cara era tão gente boa e queria tanto nos ajudar que achou uma kombi parada na cidade e pegamos a peça que precisávamos, mas a peça precisava ser retificada e fomos nós três (eu, Jé e o Pelado) com o carro dele a uma cidade vizinha a 350 km de distância para poder levar a peça na retifica, saímos às 04h00 da madrugada e voltamos no final da tarde do mesmo dia.
Foram ao total nove dias, depois de arrumarmos a peça foram dois dias para a montagem do motor e enquanto isso ficamos tentando nos entender no portunhol, bebemos muita coca-cola com vinho, almoçamos um domingo na casa do Pelado, cozinhamos um estrogonofe na oficina pra eles, falamos muita besteira e demos muita risada.
O motor foi colocado no lugar, demos partida e fizemos alguns testes pela cidade, estava tudo perfeito só faltava pagar o mecânico, eis que surge mais um grande problema para resolvermos. Não tínhamos todo o montante de dinheiro para pagar o mecânico, a oficina não aceitava cartão, os bancos da cidade não permitiam saques internacionais nem em caixas eletrônicos e ficamos na oficina mais uns dois dias tentando resolver isso.
Tentamos enviar dinheiro do Brasil mas a cidade era tão pequena que não tinha um local para receber o dinheiro, entrou o final de semana novamente, os bancos pararam de fazer transações e nós ficamos mais uma vez frustrados com tudo que estava acontecendo. Mais uma vez o Pelado fez de tudo para adiantar nosso lado e nos ajudar, por fim ele conseguiu um amigo que poderia passar o cartão de crédito em seu comércio e dar o dinheiro para podermos pagar a conta da oficina. Era sábado a noite quando conseguimos resolver tudo, bebemos uma cerveja para comemorar e nos despedir do pessoal, dormimos na oficina novamente e domingo de manhã partimos seguindo nosso caminho.
Apesar de todo o transtorno e prejuízo que tivemos foi incrível conhecer tantas pessoas do bem naquela oficina, passamos dias muito agradáveis, demos muitas risadas e já estamos sentindo falta das tardes regadas a coca com vinho e muita conversa. Queremos agradecer a todos que de alguma forma nos ajudaram e torceram para que tudo desse certo, superamos um grande obstáculo e a ajuda de todos os envolvidos foi fundamental para que continuássemos em frente.